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Entrevista...

Cerrado.
A importância do consumo sustentável dos frutos do cerrado.

            Vera Lúcia Gomes-Klein, professora do Laboratório de Morfologia e Taxonomia Vegetal do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Goiás, fala sobre o potencial dos frutos do Cerrado e da pesquisa sobre estes. Para a pesquisadora, não se deve esquecer da importância do manejo sustentável destes frutos.

Jovens Jornalistas: No que consiste o projeto sobre frutos do Cerrado?
Prof.ª Vera: É um projeto que tem se destacado devido a forma que tem sido conduzido, ou seja, o potencial de aplicação dos frutos. Estamos trabalhando com amostras de frutos e sementes do cerrado e coletando-as especialmente na Serra dos Pirineus, onde o laboratório vem desenvolvendo projetos há alguns anos.

J.J.: Neste período de pesquisa, o que foi possível observar a respeito dos frutos? Qual o seu potencial econômico?
Prof.ª Vera: A aplicação dos frutos vem se desenvolvendo de várias formas, isto sem falar que os frutos são a alimentação dos animais da localidade, portanto os frutos auxiliam na biodiversidade local, como fonte de nutrientes para os animais. Além disto, existem aqueles frutos que estão sendo estudados a respeito do potencial medicinal, ornamental, e também o uso em artesanato, como é possível observar nas feiras de nossa cidade e outros estados. Esta aplicação dos frutos ajuda a população a consumir de maneira consciente, para que ela utilize estes frutos ,mas que também os cultive, consumindo sustentavelmente.

J.J.: Boa parte da população tem conhecimento sobre o potencial destes frutos. Então, os coletam, nem sempre de forma sustentável. Isto pode explicar a atual devastação do Cerrado?
Prof.ª Vera: Isto ocorre não somente com os frutos, mas também com outras partes das plantas e até mesmo plantas inteiras, como ocorre com o capim-dourado no Tocantins. O uso destas espécies deve ser de forma consciente. Nós não devemos nunca coletar uma amostra de plantas ou de partes de plantas cuja população esteja em extinção, seja uma espécie rara, ou com poucos indivíduos, pois estaremos colaborando para a extinção daquela espécie.

J.J.: Como foi a parceria do laboratório com a empresa Frutos do Cerrado?
Prof.ª Vera: A empresa  concedeu bolsas para os estudantes, que em contrapartida ofereciam treinamento para os servidores da sorveteria. Nós levamos a informação a empresa, cujos funcionários faziam o uso, mas não conheciam os nomes científicos, época de floração. Não somente auxiliou a empresa, mas também os estudantes, que puderam atuar na área aplicada da ciência. Esta parceria resultou num trabalho, apresentado em Gramado, onde foram levados as espécies, fotos e picolés, possibilitando uma pesquisa de aceitação da comunidade de outros estados. Ainda hoje, dois anos após este trabalho, sou cobrada para dar continuidade ao projeto.

J.J.: Ainda há o que se pesquisar sobre os frutos?
Prof.ª Vera: Sim, ainda há muito a se fazer. Ainda existem possibilidades de pesquisas sobre o potencial medicinal, composição dos frutos e a diversidade dos mesmos. Precisamos coletar, fazer uma amostragem de todo período, porque os frutos não aparecem na mesma época, portanto, devemos estar sempre pesquisando em campo, para observar a diversidade destes frutos também. É preciso ainda realizar estudos multidisciplinares, fitoquímicos para conhecer melhor os frutos.

J.J: Como é o contato da pesquisa com as pessoas? O trabalho de campo é realizado juntamente com a população?
Prof.ª Vera: Sempre quando vamos realizar o trabalho de campo e que há a possibilidade, indagamos a população local algumas informações sobre os frutos que, muitas vezes, não são apresentados em literatura nenhuma. Perguntamos sobre a parte prática, como por exemplo, o nome vulgar, como a população usa o fruto. Esta é a grande parceria e projeto de extensão que pretendemos fazer, onde o aluno levaria um questionário, e, a partir deste básico,  partimos a literatura e uma pesquisa mais profunda.

J.J.: Como é a literatura do tema?
Prof.ª Vera: Existe uma literatura considerável, porém os estudos ou são imcompletos ou não são específicos de uma região. Muitas publicações foram divulgadas em relação ao aspecto morfológico, uma abordagem mais científica, dificultando que a população em geral a entenda. Se nós publicarmos um trabalho com a dificuldade muito grande para o leigo, não atingiremos nosso objetivo. Nosso objetivo é aproximar a ciência da comunidade, para que haja uma aplicação na sociedade.

J.J.: A partir do momento que passarmos a pesquisar mais o Cerrado seria mais valorizado? A pesquisa poderia auxiliar a evitar o desmatamento?
Prof.ª Vera: Sim, além de estarmos mostrando a biodiversidade do cerrado, mostrar como é ampla, é importante divulgar estes projetos para demostrar como está sendo devastado o bioma. O que ocorre é que muitas vezes devastamos sem conhecer, não sabemos se nestas plantas está a cura de doenças que ainda não podemos curar. Muita coisa ainda precisa ser descoberta. Recentemente foi relatada uma espécie nova, aqui no estado, e estamos pesquisando uma possível nova espécie, em Pirinópolis. Estamos, através de parcerias com outros colaboradores, procurando pesquisar mais o cerrado e auxiliar na preservação deste.

J.J.: O que mais tem sido pesquisado a respeito do Cerrado no laboratório?
Prof.ª Vera: Começamos um projeto de inventariar a flora de nosso estado, em complementação a um projeto institucional de inventariar a flora do estado de Goiás e Tocantins. Iniciamos o projeto em Pirenópolis, na Serra dos Pirineus, onde estamos até hoje, realizando viagens a campo todo mês. É um projeto dos cursos de Ciências Biológicas, Agronomia, Farmácia, Engenharia Florestal e Ecologia, cujos alunos estão recebendo treinamento para atuar nesta área de pesquisa do cerrado. Já temos cerca de três teses deste trabalho defendidas e alguns artigos publicados. Temos também um trabalho na área de Fitossociologia. Há também o projeto de inventariar outras áreas, estudo das floras dos estados de Goiás, Mato Grosso e do Distrito Federal.
(Por Frederico Oliveira.)

Gostaria de agradecer a professora Vera, que gentilmente me concedeu a entrevista.

"Portanto o meu povo saberá o meu nome,
por esta causa, naquele dia; porque eu mesmo sou o que digo:
Eis-me aqui" (Isaías 52:6)

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